Sumário ]

2. HISTÓRICO

A atual região Norte/Nordeste de Roraima era na época anterior à 1.500, utilizada como área de passagem de grupos indígenas denominados caribe, caracterizados por serem exploradores ou caçadores - coletores, que através do Rio Orinoco atingiam os rios Caura, Paragua e Caroni, chegando até o Alto Orinoco, rios Uraricoera, Tacutú e Rupununi. Nestas incursões, após a subida pelas altas cabeceiras do Rio Orinoco atravessavam a pé a área de savana (lavrado) do Norte/Nordeste de Roraima e chegavam à Bacia do Rio Essequibo, indo daí facilmente de volta à costa onde retomavam às suas áreas de origem.

Os aruaques devido à sua característica mais de comunidades agrícolas, após processos migratórios foram fixando pequenas aldeias em toda a área compreendida pelas margem dos rios Uraricoera, Tacutú, Surumu, Baixo Cotingo, Baixo Maú e Bacias do Rupununi e Essequibo. Estas comunidades ora estabeleciam relações comerciais com os caribe, algum intercâmbio cultural e alianças. Em certas ocasiões ocorriam conflitos, sendo que as vantagens das guerras quase sempre favorecia aos caribe que possuíam maior agressividade e mobilidade que os aruaques, representados na região pelos grupos uapixanas, saparás e paravianas.

Com a chegada dos espanhóis na região do Caribe a partir de 1.522, os índios caribe do litoral foram sendo exterminados ou empurrados para o interior, fugindo através das vias de circulação já tradicionalmente utilizadas pelos mesmos. Os macuxis, do mesmo tronco lingüístico dos caribe começaram também a serem empurrados para o Sul da bacia do Rio Orinoco, chegando em grupos cada vez mais numerosos à área até então de domínio dos aruaques. O estabelecimento de colônias inglesas e espanholas no fim do século XIV na atual região das Guianas mudou o tipo de relacionamento do europeu com o indígena. Na maior parte da vezes os holandeses e ingleses tinham como aliados os macuxís e outras etnias da área. Ao contrário, os espanhóis provocaram verdadeiro extermínio dos indígenas da bacia do Orinoco através das denominadas "entradas" que visavam capturar indígenas para trabalho escravo. O interessante é que eram utilizados os próprios caribes armados pelos espanhóis para a execução desta tarefa.

Tem-se o início da participação dos portugueses na conquista da região no fim do século XV e durante o século XVI, baseando-se nos objetivos de redução dos índios à sujeição portuguesa, comércio de índios escravos e colheita de drogas e pescarias. [Ribeiro de Sampaio - 1.825].

A conquista portuguesa esbarrou em algumas dificuldades com as populações indígenas na área: inicialmente com os manaos que vinham do Rio Negro subiam os rios Branco e Tacutú, dominando totalmente a região e mantendo aliança e comércio com os holandeses e ingleses na costa da Guiana através do Rio Essequibo . Com a prisão e morte do líder dos manaos ( Ajuricaba ), os portugueses com auxílio dos religiosos carmelitas, anunciam a "libertação" dos gentios do Rio Branco, fazendo as operações de captura de escravos, denominadas "descidas", onde milhares de indígenas foram exterminados ou capturados, sendo levados para outras regiões, principalmente Pará e Maranhão. Os remanescentes, que não fugiam para áreas de difícil acesso, foram aldeados e condicionados à agricultura que fornecia gêneros às tropas portuguesas dos Fortes São Joaquim, no Rio Tacutú e o da Barra, no Rio Negro. Estes aldeamentos produziram uma diminuição brutal destas populações devido às constantes e intensas epidemias de varíola e sarampo que atacavam quase que exclusivamente os indígenas, caracterizados por sua baixa resistência orgânica e ao íntimo contato com os portugueses, além de estarem concentrados muitos indivíduos em poucos locais, o que facilitava o mecanismo de transmissão das doenças.

Outra dificuldade encontrada pelos portugueses na conquista do vale do Rio Branco foram os espanhóis que desciam o Rio Uraricoera, o que forçou a construção por parte dos portugueses em 1.775 do Forte São Joaquim, que serviu também para defender a penetração dos ingleses e holandeses no vale do Rio Branco através do Rio Tacutu. O Forte de São Joaquim gerou a formação de alguns povoados em suas proximidades, compostos predominantemente por índios aldeados (São Felipe, Nossa Senhora da Conceição, Santa Bárbara, Santa Isabel e Nossa Senhora do Carmo, atual Boa Vista).

No fim do século XVIII iniciou-se uma deserção maciça dos índios aldeados no Rio Branco, bem como uma série de revoltas dos mesmos contra os portugueses, o que gerou uma repressão violenta pelas tropas lusas culminando com o quase extermínio dos indígenas da região num episódio denominado "praia do sangue". Após esse episódio a "lei e a ordem voltaram a imperar no Rio Branco". As constantes lutas dos macuxis com os uapixanas que prolongaram-se até metade do século XIX facilitou a manutenção da posse territorial dos portugueses, que de certa forma indireta deixaram de ter preocupações com os holandeses e ingleses da região do Essequibo que tinham envolvimento comercial com estas etnias. A partir da construção do Forte de São Joaquim em 1.775 o processo de ocupação territorial começou a ser feito de uma maneira mais permanente, com a implantação de fazendas de gado, engenhos de açúcar e casas de farinha. A fazenda São Marcos foi fundada pelo comandante do Forte São Joaquim Sá Sarmento, a fazenda São José pelo comerciante José Antonio Évora. Cabe ser ressaltado que estas propriedades eram particulares, não pertencendo ao rei como alguns equivocadamente consideram.

Em 1.887, Henri Coudreau em suas viagens pela região dos vales do Rio Branco e Rio Tacutu detectou a existência de 32 fazendas.

A partir desta época o processo de conquista da área Norte/Nordeste teve sua intensificação. Os criadores de gado iniciaram a penetração na área rica de pastagens e começaram a surgir as primeiras fazendas. A interiorização desta atividade começou a atrair as populações indígenas localizadas nos vales dos principais rios, notadamente as que estavam aldeadas, sendo utilizada como vaqueiros ou simplesmente na agricultura de subsistência destas fazendas.

A descrição dos etnólogos e antropólogos nos fins do século XIX e início do século XX são insuficientes para se afirmar a imemorialidade dos indígenas na região de savana (lavrado) já que a ocupação vai dar-se no mesmo tempo por índios e não índios.

No final do século XIX e início do século XX, inicia-se a conquista do Norte/Nordeste de Roraima, processo denominado "Pata do Boi" tão comum no restante do país, onde o conceito era o de que uma terra sem gado é terra livre, não ocupada por ninguém. Uma terra com gado é uma terra que tem dono. Consequentemente o raciocínio era de que as terras ocupadas por indígenas sem gado poderiam ser ocupadas porque estavam livres.

Esta conquista territorial foi conseqüência do êxodo de mais de 500.000 nordestinos para a Amazônia fugindo da grande seca que assolou o Nordeste em 1877.

Parte deste contingente foi assentado pelo Império Brasileiro na faixa de fronteira de 10 léguas, visando o seu rápido povoamento e consequentemente sua vigilância e defesa (Lei 601 de 18/09/1.850). Isto explica que a atual população de Roraima tenha avós e bisavós cearenses, maranhenses e paraibanos, todos de origem rural.

Os novos ocupantes das partes significativas do Norte/Nordeste de Roraima sempre tiveram uma interação muito forte com os indígenas da região, havendo uma participação no processo produtivo e principalmente miscigenação. Evidentemente que alguns conflitos localizados tenham surgido esporadicamente, mas de uma maneira geral havia um relacionamento de respeito e cooperação entre o índio e o não índio proprietário de fazendas. Este equilíbrio começou a ser rompido na década de 70, com o início de pequenos confrontos, invasões e principalmente roubo e morte de gado por indígenas vinculados à instituições ligadas à Igreja Católica. Coincidentemente nesta época (a partir de 1.975) a denominada Igreja Progressista começou o seu processo de ação bastante agressivo visando a "defesa" das etnias indígenas do Estado. A partir dos anos 80 a situação em áreas significativas da região começou a tornar-se crítica, surgindo inúmeros conflitos, existentes até hoje, razão para que sejam analisados imparcialmente os fatos e seja procurada uma solução racional que harmonize os interesses da área, onde existem índios e também não índios, assentados em terras da União. todos igualmente brasileiros, com suas tradições e costumes e principalmente por estarem engajados em processos produtivos de vital importância para a sobrevivência econômica do Estado de Roraima.