Zoneamento Ecológico

5. CENÁRIOS

5.1. Considerações

Embora se tenha desenvolvido em tempos recentes, é quase consensual a necessidade

de trabalhar-se o zoneamento ecológico-econômico em função de cenários, mas não existe

uma cultura extensiva quanto às técnicas e utilização dos mesmos. Em termos de aparelho

governamental, apenas as maiores instituições, como Eletrobrás e suas subsidiárias, Petrobrás,

BNDES e algumas universidades têm-se desenvolvido nesse campo. No presente projeto, para

o desenvolvimento analítico do plano nacional e regional, utilizou-se como referência um

abrangente trabalho de cenarização elaborado pela Eletronorte, para o Brasil e a Amazônia,

envolvendo o período 1998-2020 (*).

Segundo o documento referenciado, os principais atributos das previsões do futuro

através de cenários são:

a- Visão global da realidade: isto é, uma visão holística de todos os fenômenos so-

ciais, valorizando-se as inter-relações, na medida em que as abordagens isoladas se mos-

tram incapazes de projetar as mudanças futuras, sobretudo no atual quadro de profundas

mudanças globais, culturais, políticas e tecnológicas. Portanto, pela própria natureza os

cenários reúnem capacidade de juntar e articular opções, estudos, prognósticos, hipóteses

e contribuições diversas;

b- ênfase nos aspectos qualitativos da realidade atual ou do futuro, em diversidade às

projeções tão comuns até a década de 1960, os cenários se baseiam em opções basicamente

qualitativas, embora, é claro, não prescindam de elementos quantitativos;

c- as relações entre variáveis e atores são vistas como estruturas dinâmicas, que com-

portam mudanças qualitativas ao longo do horizonte de projeção;

d- o futuro é concebido como a motivação básica das ações e decisões do presente, e

não como um prolongamento inevitável da dinâmica do passado. A premissa básica é que as

pessoas, grupos, organizações ou classes sociais são capazes de influenciar o seu próprio des-

tino dentro de um quadro de oportunidades e restrições concretas, porém manejável por elas.

Ou, como afirmou Maurice Blondel, o futuro é uma construção social. Essa assertiva é muito

importante quando se analisam os indicadores socioeconômicos de uma região, sobretudo,

aquelas que possuam um histórico de ocupação como o de Roraima;

e- visão plural do futuro: o futuro é múltiplo e incerto, resultando da interação dos di-

ferentes atores sociais em todos os níveis, afunilando-se em torno de determinados projetos de

interesses específicos. A construção do futuro, desse modo, explica-se mais pela ação humana

do que pelo jogo de determinismos;

f– a adoção de modelos conceituais, métodos qualitativos e quantitativos e de uma vi-

são probabilística dos fenômenos, residem na base metodológica da elaboração de cenários,

tendo-se em consideração que a incerteza e a pluralidade são inerentes à exploração do futuro;

g- a consideração explícita dos atores envolvidos: cada cenário resulta do predomínio

de uma aliança de determinados atores em torno de um conjunto de interesses, o que significa

admitir que a dimensão política é talvez o maior condicionante, já que fornecem subsídios às

demais variáveis, econômicas, tecnológicas, sociais, culturais e ecológicas;

h- pertinência, coerência, plausibilidade e credibilidade: é importante a compreensão

de que um cenário não é a realidade futura, mas um meio de orientar as ações presentes à luz

de futuros possíveis ou desejáveis.

 

5.2. Tipos

Ainda com base no documento referenciado, admitiram-se duas grandes clas-

ses: os normativos e os exploratórios, sendo que a segunda classe compreende subdi-

visões como abaixo indicado.


 

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ZONEAMENTO ECOLÓGICO-ECONÔMICO

Os cenários normativos configuram futuros desejados, exprimindo sempre uma vonta-

de ou compromisso de um ator ou de uma coalizão específica de atores em relação a certos

objetivos ou projetos. Sua lógica de construção baseia-se na determinação do futuro desejado

e na posterior definição de como alcançá-lo a partir de uma presente situação. A adoção desse

tipo de premissa subentende, naturalmente, que cenários normativos adotados tenham sido

considerados os mais prováveis dentro de uma análise exploratória anterior.

Durante todo o presente projeto, cuja escala é de semidetalhe — 1: 250.000, a aborda-

gem adotada teve como referência um cenário normativo inicial, preestabelecido pela equipe

do Governo do Estado de Roraima. Assim, entrevistaram-se diversos especialistas, a fim de

caracterizar-se as potencialidades e vulnerabilidades naturais e sociais, além de obter-se prog-

nósticos sobre a sustentabilidade do cenário normativo predeterminado. Isso contribuiu, em

tese, para aperfeiçoar-se uma atitude crítica com respeito à viabilização e oportunidade das

propostas discutidas, pelo contrário, buscou-se otimizá-las, alertando-se quanto as suas restri-

ções e buscando-se outras oportunidades complementares de desenvolvimento.

Os cenários exploratórios trabalham com probabilidades de futuros possíveis. Do

ponto de vista da sua utilização, pode-se admitir que por um lado eles permitem configurar os

cenários mais prováveis e por outro são mais adequados aos níveis de planejamento em escala

de datalhe, fornecendo o pano-de-fundo das ações sub-regionais e locais.

Deve-se, outrossim, distinguir três níveis de abrangência dos cenários:

— nível "macro": macro-cenários mundiais, nacionais ou regionais;

— nível intermediário ou setorial: cenários de indústrias, segmentos ou ambiente de ne-

gócios específicos e;

— nível "micro": cenários focalizados em decisões ou questões estratégicas.

Nos níveis de maior detalhamento, a alternativa mais apropriada é a construção de

cenários setoriais ou de "ambientes de negócios" específicos. Configuram-se estruturas futu-

ras projetando-se as tendências de demandas e ofertas, surgimento ou desaparecimento de

substitutos, comportamento da concorrência (inclusive potencial), fatores institucionais espe-

cíficos e o papel dos atores mais importantes. Tais cenários fundamentam planos e decisões

estratégicas de nível intermediário, servindo para prevenir ameaças e oportunidades inerentes

ao ambiente "de negócios".

 

5.2.1. Cenários Mundiais, Nacionais, Amazônicos e Regionais.

A Amazônia dispõe de alguns excelentes trabalhos prospectivos quanto aos cenários

regionais futuros, devendo-se citar os elaborados pela ex-SUDAM, SUFRAMA e Eletronorte.

Os diagnósticos e prognósticos contidos nesses trabalhos e a contextualização das potenciali-

dades e fragilidades do território roraimense, em conformidade com os dados secundários e

primários levantados no campo e com as análises de gabinete e laboratório serão a seguir con-

siderados. Deve-se mencionar, ainda, como fonte de referência, o acervo de estudos elabora-

dos e contratados pelo Estado de Roraima.

Os cenários socioenergéticos da Amazônia (1998-2020) foram elaborados pela Eletro-

norte. Trata-se de um documento instigador, cuja leitura serve para constatar o grau de fideli-

dade das previsões estabelecidas em 1988, desde o período proposto até agora, tanto no plano

nacional como regional.

 

Apesar das surpresas decorrentes de eventos pouco previsíveis — como a derrocada

do bloco soviético e a vigorosa reestruturação da economia americana — no cenário mundial,

conforme foi antecipado, a evolução global durante a virada do século é coerente com os

elementos de instabilidade associados a profundos avanços científicos e tecnológicos e jun-

tamente com moderadas taxas de crescimento econômico.

Contudo, a revolução tecnológica, o fortalecimento do capitalismo liberal e as mudan-

ças ocorridas no Estado ultrapassaram as expectativas, exceto no que se refere ao aperfeiço-

amento das estruturas de regulação. A antecipação quanto “revisão do papel do Estado, e a

tendência liberalizante rumo às privatizações das empresas e serviços públicos”, em nível

mundial, de fato se confirmaram.

Com relação aos cenários do Brasil, em grande medida, a trajetória observada acompa-

nhou aproximadamente o desenho indicado, com várias nuanças, algumas acelerações e re-

trações nas tendências. No início da década de noventa, coincidindo com a trajetória mais

provável, começou a configurar-se uma aliança liberal e modernizadora, nos moldes do cená-

rio “liberal-conservador” de 1988. Seus primeiros passos foram no governo Collor, consoli-

dando-se na gestão de Itamar Franco e, sobretudo, com a aliança que elegeu e deu sustenta-

ção ao governo de Fernando Henrique Cardoso.

A reestruturação produtiva e a abertura da economia avançaram em ritmo mais intenso

que o esperado, enquanto que a reforma do Estado, ainda em fase de implantação, em que

pese certas dificuldades do cenário de 1988, já ultrapassaram, em vários aspectos, as melho-

res expectativas. Superando o desenho do cenário “liberal-conservador”, o Estado brasileiro

deixou de ser o grande investidor e modernizador da economia nacional. Promoveu-se a pri-

vatização da maioria das grandes empresas estatais, com exceções do porte da Petrobrás e de

algumas empresas do setor energético. Conquanto não caiba, neste documento, qualquer

avaliação de cunho político, deve-se realçar as mudanças, em termos do papel dos diversos

atores econômicos, com fortalecimento do empresariado privado, ocasionando mudanças

culturais na forma de governar.

 

No que concerne à Amazônia, o período 1988 a 1997, podendo-se estender a 2001, ca-

racterizou-se por moderada evolução e integração econômica com o Brasil, gerando um di-

namismo econômico e um crescimento populacional muito inferior ao antecipado na trajetó-

ria mais provável, aproximando-se do cenário de menor desempenho econômico (“Restrição

Ecológica”).

Nos últimos 04 anos, vêm-se consolidando diversas ações estruturantes, como o asfal-

tamento de BR-174 e a ponte sobre o Rio Branco, em Caracaraí; a conclusão da linha de

energia que liga a capital Rio Branco a Guri e a valorização do planejamento embasado em

informações científicas sobre o meio ambiente.

Por outro lado, o Estado, após ser criado, em 1988, à medida que se vem consolidando

administrativamente, promove a melhoria generalizada das condições de vida de sua popula-

ção, na qual se pode identificar um ciclo migratório diferente dos anteriores, que vem incor-

porando agentes econômicos, na busca de novas oportunidades.

Mas evoluem os processos de degradação ambiental, impulsionados pelas demandas

sociais e econômicas e pelo insuficiente conhecimento sobre o território, associados a defici-

ências nas estruturas de comando e controle.

O desenho atual do espaço Amazônico, incluindo-se Roraima, tem características seme-

lhantes às antecipadas na trajetória mais provável – formação e consolidação dos pólos —

embora, aparentemente, não se tenha um bom nível de integração econômica.

   Construindo Futuros Alternativos — Mundo, Brasil, Amazônia.

Sob esse título, a Eletronorte explora as possibilidades e os desafios que se apresentam

a curto (1998-2002), médio (2002-2010) e longo prazo (2010-2020) para o Mundo, Brasil e

Amazônia. Apesar do marcante grau de acerto do cenário proposto, cotejado ao que ocorreu

nos últimos três anos e meio, destaca-se a afirmativa: “a única coisa constante é a mudança”, o

que, cada vez mais, parece confirmar-se.

Há treze vetores mais importantes nas projeções futuras, igualmente atuais e que deverão

ser considerados nos estudos de viabilidade econômica que se irão seguir nos próximos anos:

 REVOLUÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA: constante, implicando em mudanças radi-

cais nos processos de produção e nos produtos, propiciando alterações nas relações de compe-

titividades em escala planetária;

 INTEGRAÇÃO DOS MERCADOS E INTERNACIONALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO: com o au-

mento da liberalização do comércio e formação de blocos econômicos regionais;

 REDUÇÃO DA MARGEM DE MANOBRA DOS ESTADOS-NAÇÕES: em decorrência do in-

cremento nas taxas de integração dos mercados e formação de grandes redes mundiais em

torno de multinacionais;

 CRISE DO SISTEMA DE REGULAÇÃO E EMERGÊNCIA DE NOVAS INSTÂNCIAS: no que diz

respeito a um padrão monetário internacional;

 INSTABILIDADE DO SISTEMA FINANCEIRO MUNDIAL: como decorrência da falta de re-

gulação e da enorme mobilidade dos recursos, tem-se um ambiente propício à instabilidade;

 HEGEMONIA UNIPOLAR, LIDERADA PELOS ESTADOS UNIDOS: conforme já demonstra-

do sobejamente por esse país ao final do século XX;

 EMERGÊNCIA DOS PAÍSES DE GRANDE POTENCIAL ECONÔMICO: identificaram-se 05 paí-

ses, entre eles o Brasil, que combinam grandes e diversificados mercados, base tecnológica e

industrial e atratividade para capitais em busca de retornos compensadores a médio e longo prazo;

 DESIGUALDADES ENTRE PAÍSES RICOS E POBRES: continuarão a existir localmente, in-

clusive, aumentando e reforçando a concentração econômica mundial;


 

 EXPLOSÃO DE TENSÕES, GUERRAS E CONFLITOS REGIONAIS: no meio de um amplo
processo de globalização e como resultado do mesmo, inclusive, persistem e surgem novos
focos de tensões e conflitos regionais, ameaçando a paz mundial;
 ENVELHECIMENTO ACELERADO DA POPULAÇÃO MUNDIAL: em face do aumento da ex-
pectativa de vida e redução dos índices de natalidade;
 DESIGUALDADES SOCIAIS E DESEMPREGO NOS PAÍSES DESENVOLVIDOS: projetado em
função de tendências já existentes em meados da década de 90;
 DEGRADAÇÃO AMBIENTAL: crescente em função da expansão econômica em escala
planetária;
    REDES MUNDIAIS DE NARCOTRÁFICO E CONTRAVENÇÃO: considerando que o tráfico
de drogas é talvez uma das atividades econômicas mais globalizadas.

5.2.1.1. Cenários Mundiais (Alternativos)
O estudo patrocinado pela Eletronorte optou pela elaboração de 03 cenários básicos,
denominados de “longo ciclo de prosperidade, dinamismo excludente e instabilidade e frag-
mentação” que tipificam situações que de certa forma vivenciamos em algum grau durante os
últimos 30-40 anos. O quadro abaixo sumaria as três situações antevistas:

 

No mesmo trabalho, traçou-se uma trajetória mais provável, que merece ser reprodu-
zida, não só pelo óbvio interesse quanto ao planejamento geral, mas por seu alto valor quan-
do da aplicabilidade com respeito ao primeiro período avaliado (1998-2002).
Prevê-se, com justos motivos, que para o segundo período (2003-2012) se deverá
comprovar um bom grau de acerto.
Por outro lado, explica-se a visão otimista em relação ao período mais distante, pela
projeção dos efeitos de uma construção social, psicológica e politicamente previsível para
quem conhece a sociedade roraimense.

 

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